"No próprio dia da batalha, as verdades podem ser pinçadas em toda a sua nudez, perguntando apenas;
porém, na manhã seguinte, elas já terão começado a trajar seus uniformes."

(Sir Ian Hamilton)



sábado, 26 de agosto de 2017

BILLY MITCHELL E SUA VISÃO SOBRE O PODER AÉREO: UM HOMEM À FRENTE DE SEU TEMPO

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A criação dos serviços aéreos nos diversos exércitos e marinhas do mundo, no final da década de 1910, revelou a necessidade da elaboração de uma doutrina de emprego capaz de permitir a utilização mais adequada dos novos meios de combate. Nesse sentido, surgiram, logo após a 1ª Guerra Mundial, teóricos militares que buscaram estabelecer as bases do emprego da nova aviação de guerra, dando origem à teoria do Poder Aéreo.

A experiência da 1ª Guerra Mundial provocou um intenso debate sobre a aplicação dos meios aéreos, sendo os principais teóricos Giulio Douhet, na Itália; Hugh Trenchard, na Grã-Bretanha, e William Mitchell nos EUA. Esses três oficiais contemporâneos eram defensores persistentes da utilização do avião para fins militares.

O General norte-americano William “Billy” Mitchell, contemporâneo de Douhet e Trenchard, desempenhou papel essencial na elaboração do Poder Aéreo dos EUA. Mitchell aprendeu a voar como major, aos 38 anos de idade, e desempenhava a função de observador americano na França quando os EUA entraram na guerra, em 1917, tendo lá estabelecido e comandado o Corpo Aéreo do Exército dos EUA.

O major Billy Mitchell em sua aeronave na França, durante a 1ª Guerra Mundial.

Considerava importante o bombardeio estratégico, mas, ao contrário de Douhet, atribuía grande valor às aeronaves de caça, e, na sua concepção, o enfrentamento entre as forças aéreas oponentes ocupava lugar de destaque.

Mitchell era um estudioso de estratégia e causava-lhe exasperação a falta de atenção das autoridades com o desenvolvimento do Poder Aéreo. Segundo acreditava, era a única forma de dar ao país a vitória na próxima guerra, que previa como inevitável. Na defesa de suas opiniões, entrou em choque diversas vezes com seus superiores. Dentre os choques que travou com a estrutura militar, dois são dignos de registro.

William "Billy" Mitchell, fotografado no início da década de 1920 no posto de Brigadeiro-General com todas as suas condecorações.

Em 1921, sentindo-se ridicularizado pela Marinha, após ter expressado a opinião de que um encouraçado – que custava mil vezes mais que um avião – podia ser afundado por apenas um desses engenhos, desafiou a força naval para um teste. O experimento foi realizado, e o resultado foi o afundamento do ex-encouraçado alemão Ostfriesland por aviões bombardeiros que lançaram bombas de 2.000 libras durante manobras realizadas ao largo da costa de Norfolk.

O experimento de Mitchell de 1921, na costa da Virginia. Um bombardeiro Martin MB-2 lança uma bomba de fósforo branco sobre o encouraçado SMS Ostfriesland


Uma bomba explode junto á proa do encouraçado SMS Ostfriesland


Mortalmente ferido pelas bombas da aviação, o SMS Ostfriesland afunda na costa da Virgínia: o Poder Aéreo se afirmava sobre os antigos encouraçados

As lideranças da Marinha dos EUA, contudo, não se sensibilizaram. Mesmo diante do sucesso da demonstração de Mitchell, ao afundar o Ostfriesland, com bombas lançadas por aviões, os almirantes norte-americanos permaneceram crentes no poder do navio encouraçado, e desprezaram a eficácia do avião contra o navio. Após a experiência, um relatório do Chefe do Estado-Maior do Exército dos EUA chegou a atribuir ao poderio da aviação o mesmo valor das minas navais, lançadas para bloquear os portos inimigos, obviamente subestimando o Poder Aéreo.

Charge publicada no jornal Chicago Tribune sobre o experimento de Billy Mitchell mostrando as visões antagônicas dos almirantes e dos defensores do Poder Aéreo.
Marinha: " Um alvo estacionário indefeso e, ainda assim, veja quanto tempo levou para os aviões bombardeiros afundá-lo!"
Aviadores: "Sim, mas nós o afundamos, não?"

O outro enfrentamento com os superiores do qual Mitchell tomou parte ocorreu em 1925, quando foi submetido à corte marcial por ter chamado publicamente de incompetentes os líderes da Marinha e do Exército. A Corte Marcial, que durou sete semanas, se converteu, na realidade, em um seminário sobre estratégia e sua teoria do Poder Aéreo, onde Mitchell predisse que a próxima guerra seria global, que os EUA enfrentariam o Japão, que os porta-aviões não poderiam fazer frente à aviação baseada em terra e que um forte Poder Aéreo era a única forma de enfrentar com êxito tal situação. Com exceção da vulnerabilidade dos porta-aviões diante da aviação baseada em terra, Mitchell acertou todos os demais quesitos de suas previsões.

Billy Mitchell (o segundo, da direita para a esquerda) sendo submetido à corte marcial. Seria rebaixado ao posto de tenente-coronel, mas defenderia, com grande visibilidade, o conceito do Poder Aéreo.

Mitchell considerava que a única defesa contra o ataque aéreo seria a própria aviação. A força aérea deveria ser constituída por uma força estratégica de grande raio de ação, e por uma série de unidades aéreas locais de defesa, para proteção dos centros vitais do poder. Diferentemente de Douhet, admitia a criação de forças aéreas auxiliares, principalmente com finalidade de observação e transporte, ligadas à marinha e ao exército.

Billy Mitchell pagou um alto preço por estar à frente de seu tempo, Condenado pela corte marcial, foi sentenciado ao rebaixamento, regredindo do posto de brigadeiro-general ao de tenente-coronel. No entanto, sua contribuição para o emprego do Poder Aéreo foi imensa.


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UM CÉU CINZENTO: A HISTÓRIA DA AVIAÇÃO NA REVOLUÇÃO DE 1932


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Um comentário:

  1. Acertou também que o Nae não pode contra uma Força Aérea baseada no território estrangeiro, vide os Marines saltarem de ilha em ilha até botar o Japão ao alcance eficaz dos B-29.

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